Baixa da testosterona em homens é sinal central para se detectar agravamento da Covid-19, diz pesquisa

A queda do nível de testosterona em homens com Covid-19 é um alerta que a doença tende a se agravar, mesmo que outros indicadores não estejam aparentes. Trata-se de um sinal que surge quando ainda há tempo para evitar o agravamento. Uma pesquisa inédita e ainda em curso de cientistas brasileiros mostra que, no homem, a baixa da testosterona é um divisor de águas para o agravamento da Covid-19.

Já se sabia que homens são mais suscetíveis do que as mulheres à Covid-19. Ser homem é, por si, só fator de risco. Eles são maioria nos leitos de UTI de Covid-19 e também entre os mortos. Mas o estudo vai além e sugere que a concentração da testosterona é um instrumento de diagnóstico poderoso, que pode salvar vidas.

A pesquisa promete mais. Pavimenta o caminho para tratar homens e mulheres de formas distintas e mais eficientes.

Ainda temos muito o que aprender sobre a Covid-19, mas tudo indica que homens e mulheres deveriam ser tratados de forma diferente. Buscamos descobrir exatamente como _ afirma a imunologista Cristina Ribeiro de Barros Cardoso, da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo (USP).

Cardoso apresentou dados do estudo que coordena no workshop “Pandemia de Covid-19: o que os cientistas brasileiros estão fazendo”, realizado pela Sociedade Brasileira de Imunologia este mês.

A descoberta vale para homens de qualquer idade, mas é mais significativa naqueles acima de 50 anos. Pois estes estão sujeitos a riscos maiores devido a mudanças naturais do organismo decorrentes do envelhecimento.

Importância dos hormônios na Covid

O estudo evidencia a importância dos hormônios na Covid-19. Os sistemas imunológico e endócrino são conectados e se influenciam mutuamente. Por isso, faz todo sentido entender a Covid-19 investigando hormônios, explica Cardoso.

Já sabemos que os níveis de testosterona começam a cair em homens com Covid-19 em quadro moderado, principalmente nos acima dos 50 anos. Os médicos devem ligar o sinal vermelho, pois aquele paciente vai agravar — frisa Cardoso.

Ela e seus colegas fizeram a pesquisa em duas etapas. Primeiro analisaram dados de 12 mil homens e 13 mil mulheres com diagnóstico de Covid-19 confirmado por PCR.

Os cientistas escrutinaram então todos os fatores possíveis e o único ponto em comum nos casos graves em homens, independentemente da idade e de qualquer comorbidade, é a queda drástica do nível de testosterona. Nos homens mais velhos tende a ser pior, pois eles já têm naturalmente níveis mais baixos.

O passo seguinte foi estudar em laboratório, em culturas de células, as interações entre a infecção pelo coronavírus e os hormônios. Essa é a etapa que continua em andamento.

Homens e mulheres reagem de forma diferente a doenças. Os homens tendem a ser mais suscetíveis a infecções virais, como a gripe. Já as mulheres são mais afetadas por doenças autoimunes, como lúpus, ligadas a uma resposta inflamatória excessiva do próprio corpo. E a testosterona tem muito a ver com tudo isso.

O hormônio sexual masculino tem ação anti-inflamatória. Por isso, alivia um ataque do sistema imune ao próprio organismo. Em contrapartida, pode prejudicar a resposta rápida a infecções virais, pois a inflamação é uma reação de defesa.

Coronavírus semeia o caos

O organismo de homens e mulheres vive em permanente busca de equilíbrio entre defesa e ataque. O coronavírus, porém, semeia o caos. E na Covid-19 a situação é mais complexa.

Os cientistas ainda não sabem explicar exatamente qual a relação da testosterona com a Covid-19. Uma possibilidade é que por ser anti-inflamatória ela reduza as defesas iniciais e facilite o espalhamento do Sars-CoV-2 pelo corpo. Mas isso por si só não explicaria sua queda nos casos que agravam.

A testosterona, mais precisamente um derivado dela, o DHT, o hormônio masculinizante, estimula a produção de uma enzima essencial para que o Sars-CoV-2 entre nas células humanas. Essa enzima é conhecida pela sigla TMPRSS2.

Cardoso diz que uma hipótese é que a testosterona do homem seja “capturada” pelo vírus para infectar mais células. O grupo dela descobriu que bloquear o DHT em células humanas infectadas em laboratório com o coronavírus impede a replicação viral. As células são salvas.

Acreditamos que a testosterona fica baixa no homem porque está sendo consumida, transformada em DHT e favorecendo o vírus. O hormônio não estaria deixando de ser produzido, mas estaria sendo usado de outra forma. E no homem agravaria mais porque seu hormônio escancararia as portas do organismo para o coronavírus — diz Cardoso.

Ela alerta, no entanto, que não adianta tomar ou retirar a testosterona para tratar a Covid-19. O ajuste é muito mais sutil e faz parte da mais refinada bioquímica conhecida, a do corpo humano.

Fazer isso seria uma loucura completa. Tirar a testosterona pode abrir caminho para mais inflamação e repor os níveis daria mais força ao vírus. Ainda precisamos descobrir qual o ajuste correto e o que realmente ocorre com a testosterona — adverte a cientista.

Porém, diz, os cientistas estão convictos de que o alerta é claro e deve ser observado pelos médicos:

A queda do nível de testosterona é um claro indicador de que um paciente de Covid-19 caminha para o pior. Não importa se um homem tem 20, 40 ou 50 anos, se a testosterona está caindo, é um péssimo sinal — salienta Cardoso.

Ela observa também que, embora as mulheres também tenham testosterona, sua concentração é naturalmente muito baixa e não teria influência sobre o curso da Covid-19.

As mulheres podem agravar o quadro, mas devido a outros fatores — acrescenta a imunologista.

Os baixos níveis de hormônios são inclusive uma das hipóteses investigadas para explicar por que as crianças raramente evoluem para quadros graves de Covid-19. Elas não amadureceram seu sistema endócrino e não teriam hormônios suficientes para influenciar o curso da Covid-19. Existem em estudos internacionais que investigam essa possibilidade. Cardoso diz ainda que outros hormônios, como o cortisol, também estão sendo investigados.

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