Embora o número exato seja um segredo bem guardado pelo governo russo, entre os milhares de soldados mortos na Ucrânia, muitos são bem jovens, pobres e alguns de minorias étnicas, afirmam especialistas. O Kremlin não se manifesta sobre o assunto desde 25 de março, ou seja, um mês e um dia após o início do conflito.
Na ocasião, o governo russo havia admitido que 1.351 soldados morreram em combate, enquanto o balanço oficial anterior, de 2 de março, registrou 498 soldados mortos.
Após sete semanas de combates destrutivos e vários vídeos que mostram grandes perdas do lado inimigo, o governo ucraniano estima a cifra de mortos em 27 mil. Um número elevado, segundo vários militares e analistas ocidentais, para quem as avaliações russas, por outro lado, são muito subestimadas.
“A Rússia sofreu, provavelmente, perdas que correspondem a um terço da força de combate terrestre enviada em fevereiro”, observou, no domingo, o ministério britânico da Defesa. Ou seja, seriam 50 mil soldados russos feridos ou mortos.
Fazendo o cálculo de que, a cada três feridos, há um morto reconhecido por Moscou, chegamos ao número de 12.500 mortos em menos de três meses. Ou seja, muito perto dos 15 mil soviéticos mortos em uma década da guerra no Afeganistão (entre 1979 e 1989), que provocou um trauma nacional e a derrocada da União Soviética.
Nós nos inclinamos perante nossos companheiros de armas mortos corajosamente em um combate justo pela Rússia — disse Vladimir Putin, em homenagem prestada em 9 de maio, Dia da Vitória.
“Perda irreparável”
A morte de cada soldado ou oficial é causa de pesar para nós e uma perda irreparável para as pessoas próximas — acrescentou o presidente russo, anunciando uma série de medidas para ajudar as famílias dos feridos e mortos.
O site russófono Mediazona reportou ter confirmado a morte de 2.099 soldados russos em combate até 6 de maio, unicamente a partir de fontes abertas. Grande parte deles tinham entre 21 e 23 anos, e outros 74 nem mesmo 20 anos, de acordo com o veículo.
Poucos deles são originários de Moscou ou São Petersburgo, duas cidades mais ricas do que a média russa. A maioria dos mortos provém do sul do país, especialmente da região do Cáucaso Norte, majoritariamente muçulmana, assim como da Sibéria central.
O maior número de mortos (135) foi confirmado entre soldados da região muçulmana do Cáucaso Norte, o Daguestão, seguidos dos buriácios (98), uma minoria mongol proveniente da Buriácia, província da Sibéria.
Dmitro, médico entrevistado pela AFP em abril, em Zaporíjia, no Sul da Ucrânia, contou, depois de viver por mais de um mês a invasão e os bombardeios em Mariupol, que foram “três ondas” de ocupantes em sua cidade.
Os buriácios, que sucederam os separatistas pró-russos do Donbass, “saquearam tudo”, depois os chechenos, culpados de fazer uma “caça aos seres humanos”.
A maioria de soldados e oficiais de infantaria do Exército provém de pequenas cidades e povoados da Rússia. Isto está relacionado com a estratificação sócio-econômica e educacional — diz à AFP Pavel Luzin, comentarista do site Riddle Russia.
A razão, explica, é que “as exigências para o serviço militar no Exército são relativamente baixas”. Os melhores soldados e futuros oficiais preferem outras forças como as aeroespaciais, as forças balísticas estratégicas e a Marinha.
A mídia local e as redes sociais do Daguestão, uma das regiões mais pobres da Rússia, devastada durante anos por uma insurreição islâmica, estão repletas de imagens de pais enlutados, recebendo as condolências das autoridades.
Kamil Iziiev, chefe do distrito de Buinakski, no Daguestão, publicou em maio um vídeo na rede Telegram, no qual aparece entregando recompensas às famílias de cinco soldados mortos no front, recebidas por viúvas e mães usando o véu muçulmano.
O primeiro soldado russo com a morte confirmada oficialmente pela Rússia foi Nurmagomed Gadzhimagomedov, um jovem daguestanês que, segundo a imprensa estatal, morreu salvando seus parceiros.
Ele foi condecorado em caráter póstumo com a ordem Heróis da Rússia em 4 de março por Putin. Na ocasião, o presidente russo elogiou o desempenho das minorias étnicas na Ucrânia e mostrou-se “orgulhoso de pertencer a este mundo, este povo poderoso, forte e multinacional que é a Rússia”.